Baixo
A palavra “simulação” pode ter um significado bem abrangente na engenharia aeronáutica. Diversos componentes do avião são simulados individualmente para estimar como seria o seu funcionamento quando em voo. Especificamente na área da aeronáutica, voltada ao voo do avião, o termo simulação tem sido aplicado relacionado à dinâmica de voo da aeronave, referenciado como uma simulação de Mecânica do Voo.
A simulação de mecânica de voo requer diversas informações que não estão disponíveis no começo do projeto. Por este motivo é usual que na fase de estudos conceituais a abordagem seja mais comparativa, utilizando o conceito de volume de cauda. O volume de cauda possui uma relação física com as características geométricas da aeronave, e está relacionado ao nível de estabilidade com que as empenagens, horizontal(HT) e vertical(VT), irão contribuir. O volume de cauda horizontal é usualmente referenciado como Vh e o da vertical como Vv. De posse de uma três vistas da aeronave é possível determinar este parâmetro geométrico, e alimentar uma tabela de dados que auxiliará na definição do comprimento da cauda e área das empenagens baseada na comparação com outras aeronaves.
Sendo:
O coeficiente de volume de cauda aparece no equacionamento básico linearizado da estabilidade estática. Portanto é um parâmetro que surgiu a partir das equações de balanço de força na aeronave.
O entendimento físico também é interessante. No caso do Vh, no denominador estão os principais parâmetros da contribuição da empenagem, horizontal ou vertical, para a estabilidade da aeronave: área da empenagem e distância para a asa. Estes dois parâmetros possuem relação direta com o momento estabilizante que as empenagens são capazes de fazer. No numerador estão parâmetros relacionados à contribuição da asa para o momento: área de asa, corda média aerodinâmica da asa para o Vh e envergadura da asa para o Vv.
É importante ressaltar que a comparação dos volumes de cauda deve ser feita para aeronaves similares. Outros parâmetros tais como o tipo de empenagem (baixa, cruz ou alta), velocidade de voo (que influencia o enflechamento da asa, empenagem e sua eficiência) e tipo de controle (malha aberta, mecânico ou malha fechada) irão alterar o volume de cauda de uma aeronave. Um exemplo básico é comparar o volume do A320, que possui lei de controle malha fechada (Full Fly-by-wire), com o 737-800 que não possui a malha fechada. O A320 possui 0.80 de Vh enquanto o 737 é 1.1.
Esta comparação deve ser baseada em aeronaves existentes, que já estão voando e certificada, assim é possível inferir que um mesmo volume de cauda proverá uma estabilidade similar à aeronave de referência, garantindo o atendimento aos requisitos de certificação. Trata-se de um método semi-empírico, muito útil no começo da fase do projeto, mas que possui suas limitações em diversas simplificações.
Definido o tamanho básico das empenagens na fase de estudos conceituais é hora de começar realmente a simular o voo da aeronave para verificação se os requisitos de projeto e certificação são atendidos. Para este fim é necessário que os principais componentes da aeronave tenham a física representada de maneira adequada. O conjunto destas diversas componentes que são relevantes à simulação do voo é chamado de modelo de simulação.
A indústria aeronáutica tem utilizado amplamente o Simulink do software MatLab® para a programação visual. A figura abaixo apresenta de maneira esquemática todos os componentes que são modelados. Um modelo completo normalmente inclui os seguintes “blocos”:
De uma maneira geral, para uma dada condição de voo as forças e momentos de cada contribuinte serão calculados para que a força resultante seja determinada. As forças e momentos resultantes, associados aos dados de propriedades de massa da aeronave (C.G., massa e inércia), são levados às equações de movimento que fornecerão as velocidades e acelerações do avião naquele momento.
A simulação é calculada a partir de uma integral numérica no tempo. Isto que dizer que é definida uma condição inicial, a partir desta condição o somatório de forças e acelerações resultantes é determinado e aplicado para um incremento de tempo seguinte e assim por diante. Ao longo da simulação as superfícies de controle podem ser movimentadas com base no tipo de comando dado pelo piloto ou lei de controle (bloco Controles).
O coração do modelo de simulação é a Aerodinâmica, também referenciado como Banco de Dados Aerodinâmicos. O termo banco de dados é muito bem aplicado neste caso, pois em um modelo com seis graus de liberdade são consideradas as variações de todos os 6 coeficientes aerodinâmicos (forças: CL, CD e CY; momentos: CM, CR e CN) em função da variação do ângulo de ataque, ângulo de derrapagem, deflexão das superfícies de controle, superfícies de hiper-sustentação (flapes e slats), efeito solo e número de Mach. São muitas combinações.
Para montar este quebra-cabeça gigante é adotada a filosofia de “breakdown”. Esta filosofia consiste em determinar o efeito isolado de cada um dos componentes e parâmetros e, a partir da soma de todos os contribuintes, determinarem os coeficientes totais da aeronave.
A fonte de dados para cada um dos coeficientes aerodinâmicos vai depender da fase de desenvolvimento do avião. No começo é esperado que a principal fonte de dados sejam métodos semi-empíricos, como os encontrados no ESDU, DATCOM, Hoerner, dentre outros. Estes métodos semi-empíricos costumam prever apenas os comportamentos lineares dos coeficientes. Em um segundo momento é possível que sejam utilizados métodos de aerodinâmica numérica (CFD), de média e alta fidelidade. Nesta fase a geometria do avião já deve ser conhecida, mesmo que em uma forma preliminar.
Histórico de tempo de ensaio em Túnel de Vento para o desenvolvimento de um avião
A utilização de CFD tem crescido com o aumento da capacidade de processamento computacional que resultou em maior fidelidade dos resultados e tempo adequado de processamento. No entanto, os modelos numéricos ainda possuem limitações quando há descolamento da camada limite e interação entre ondas de choque com a camada limite. Especialmente nestes casos o túnel de vento continua a ser a fonte mais confiável.
O objetivo das simulações é verificar o atendimento a requisitos de produto, requisitos de certificação e a qualidade de voo da aeronave. As simulações envolvem todas as fases de voo: decolagem, subida, cruzeiro, descida e pouso. Podem ser tão simples quanto a verificação da margem estática, deflexão do profundor e força no manche em função da velocidade e fator de carga, quanto simulações dinâmicas. No segundo caso as derivadas dinâmicas, baseadas na mudança dos coeficientes da asa-fuselagem e ângulo de ataque induzido nas empenagens, devem ser consideradas.
As manobras básicas incluem, por exemplo, a decolagem mono-motor, pouso com vento de través e mesmo casos de falha de alguns componentes. Caso algum requisito não esteja sendo cumprido, a geometria ou algum sistema do avião será modificado para garantir o atendimento. O modelo para simular o voo também é fundamental para o projeto da lei de controle, no caso de aeronaves fly-by-wire.
Condições limites que definem as cargas de dimensionando da aeronave também são simuladas. Estas cargas determinadas na simulação são então distribuídas ao longo dos componentes da aeronave e utilizadas para o cálculo estrutural.
Antes de o avião voar o modelo deve ser capaz de representar com fidelidade o voo da aeronave. Além das simulações de computador é usual que o modelo seja utilizado em algum simulador de engenharia, e assim os pilotos podem voar o avião antes mesmo que ele exista. Todas as manobras a serem executadas em voo passarão por uma simulação no modelo primeiro, aonde será validada a segurança para que o ensaio em voo aconteça.
Os modelos para simular o voo baseados em resultados de túnel de vento, devidamente corrigidos para as condições de voo real (principalmente a diferença de número de Reynolds) costumam apresentar uma boa fidelidade com o voo. Ainda assim, para o desenvolvimento de um Full FLight Simulator de treinamento a representatividade deve ser maior. Por este motivo é usual que após a fase de voo os dados de modelo e ensaios em voo sejam comparados, e os devidos ajustes feitos, de forma a deixar o modelo idêntico ao voo.
Um Full Flight Simulator é tão representativo da aeronave real, em termos de dinâmica do voo e cabine, que é possível que um piloto seja habilitado para voar uma certa aeronave sem nunca ter entrado em uma aeronave daquele modelo.
Para atingir este nível de maturidade no modelo de simulação são executadas diversas manobras longitudinais e latero-direcionais ao longo de todo o envelope de voo da aeronave, fazendo com que seja possível simular o voo da aeronave de forma imensamente precisa. É comum que nestes vôos seja utilizada uma instrumentação de ensaios em voo dedicada, ou pelo menos calibração dedicada, para garantir as qualidades dos dados.
As mesmas manobras executadas em voo são repetidas no modelo, os resultados são comparados e ajustes nos coeficientes aerodinâmicos são feitos até que este reproduza o voo com perfeição.
Em uma fabricante de aviões o modelo de simulação elaborado pela equipe de aerodinâmica aplicada e mecânica de voo servirá como ferramenta de trabalho para dezenas, ou mesmo centenas, de engenheiros. A responsabilidade envolvida no desenvolvimento de cada componente e principalmente do Banco de Dados Aerodinâmicos é grande, pois erros nestes dados básicos poderiam levar uma reação em cadeia de resultados ruins, com impacto na mecânica de voo, desempenho da aeronave e mesmo cargas de componentes. Por esse motivo, conseguir simular o voo do avião de forma precisa, é tão importante.
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